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Convênio ABES e BID: leia a entrevista com Irene Guimarães Altafin, uma das idealizadoras

Irene Guimarães Altafin, PMP, Doutora em Engenharia - Recursos Hídricos e consultora

Por Sueli Melo

Em 2014, a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental – ABES e o Banco Interamericano de Desenvolvimento firmaram um acordo de Cooperação Técnica, visando a regulação no setor de saneamento no Brasil. O projeto contempla o Curso EAD (Ensino a distância), que foi iniciado no último dia 27 de junho e que tem sido um sucesso de realização. Nesta entrevista, Irene Guimarães Altafin, PMP, Doutora em Engenharia – Recursos Hídricos e consultora, que idealizou o projeto, discorre sobre a importante parceria para o saneamento e para o país, dos porquês da escolha da ABES e da motivação para o convênio. Irene elenca, ainda, os desafios enfrentados ao longo deste percurso para que o projeto de realizasse. Leia a entrevista a seguir:

ABES Notícias – Como surgiu a ideia de fazer este convênio? 

Irene Guimarães Altafin  – Em setembro de 2013, o BID apoiou a ABES na realização do curso prévio ao 27º CBESA, ocorrido em Goiânia, sobre Regulação, organizado por Ester Feche, que à época coordenava a Câmara Temática sobre Regulação, da ABES. Durante o curso foi constatado que muitos conceitos sobre a regulação do Setor ainda não estavam internalizados pelos poderes concedentes e prestadores dos serviços, além da heterogeneidade e da disparidade existentes na estruturação das Agências Reguladoras no país, requeridas a partir da aprovação da Lei 11.445/07. Como ação complementar, durante o Congresso foi realizada uma pesquisa qualitativa entre os participantes, para identificar os principais entraves à criação de um ambiente regulatório dos serviços de saneamento. Dentre eles, foram identificados a falta de autonomia do regulador para exercer suas funções, o desconhecimento por parte dos prestadores de serviços sobre as funções e os mecanismos de um processo regulatório, a falta de conhecimento e experiência na teoria da regulação e a necessidade de criação de um sistema de indicadores para monitorar a eficiência do processo, entre outros.  A repercussão favorável do curso e a constatação do vazio de conhecimento existente sobre o processo regulatório dos serviços de saneamento foram os motivadores para ABES e BID construírem uma Cooperação Técnica, assinada em 2014.

ABES Notícias – Por que a escolha da ABES como parceira?

Irene Guimarães Altafin – O principal interesse do BID com a realização de uma cooperação técnica era apoiar o Brasil na construção dos alicerces de um ambiente regulatório dos serviços de saneamento. Com isso em mente, o Banco procurou um parceiro com amplo conhecimento do setor; com experiência em criação de capital humano; com capilaridade nos estados brasileiros e, principalmente, um parceiro que representasse um espaço aberto para a discussão e o diálogo entre reguladores, regulados, o poder concedente e sociedade. A escolha foi fácil: a ABES é uma das poucas organizações brasileiras que congrega todos esses requisitos para o desenvolvimento de uma cooperação técnica que é calcada em três pilares: aprofundar o conhecimento sobre o quadro atual da regulação do setor; formar capital humano, por meio do desenvolvimento de um sistema de ensino a distância e propor um sistema de indicadores que possibilite comparações, benchmarking e que promova a qualidade da regulação.

ABES Notícias – Algumas regiões do Brasil enfrentaram uma crise hídrica sem precedentes, entre 2014 e 2015. Como a qualificação dos profissionais em relação à regulação dos serviços de saneamento pode ajudar nesse cenário?

Irene Guimarães Altafin – Os eventos de escassez hídrica ocorridos na Região Sudeste desde 2012 alteraram a percepção da população de que o Brasil é a de um país com “abundância de água”. No imaginário geral, a exceção do semiárido, o brasileiro se sentia abençoado por viver em um país com excesso de água e apenas recentemente incorporou a noção da distribuição desigual existente no País e da ocorrência de períodos de escassez hídrica em regiões consideradas com baixas probabilidades de insuficiência de água. Isso trouxe uma maior consciência à população sobre a importância de usar a água de maneira racional e aos prestadores de serviços sobre a importância do planejamento como ferramenta básica para uma prestação dos serviços eficiente. Vivemos em um país que não superou o desafio de prover os serviços de água e de saneamento a toda população e que concomitantemente precisa enfrentar os efeitos das mudanças do clima na disponibilidade hídrica. Nesse cenário, o papel da regulação dos serviços é essencial no estabelecimento de parâmetros para uma melhor gestão dos serviços, na busca de tecnologias poupadores de água e de reuso, na busca da eficiência do gasto e, na promoção do controle social com o envolvimento da sociedade não só no acompanhamento dos serviços, mas também como partícipe na proposta de usar a água de maneira racional.

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ABES Notícias – Qual a importância deste projeto considerando a realidade brasileira?

Irene Guimarães Altafin – As necessidades de investimentos para o setor de saneamento no Brasil são altas e sabemos que não cumpriremos as metas do PLANSAB, que prevê a necessidade de investimentos da ordem de R$ 15 bi ao ano, para que seja possível a universalização dos serviços até 2033. Apesar dos investimentos disponibilizados pelo PAC, a partir de 2007, na faixa de R$ 8,9 bi ao ano, serem superiores aos recursos financeiros aplicados nas décadas anteriores, o impacto observado no aumento da cobertura dos serviços está abaixo do esperado. A eficiência do gasto é baixa, a gestão dos serviços é, muitas vezes, ineficaz e a regulação é ineficiente ou inexistente.

Este projeto tem o mérito de contribuir concretamente para a criação e consolidação de um ambiente regulatório do setor de saneamento no Brasil. A regulação no Brasil é fundamental, não somente para a melhoria da qualidade dos serviços hoje oferecidos à população, como também para atrair outros investidores, promovendo o aumento da participação privada no setor, ainda reticente, pelas incertezas regulatórias.

ABES Notícias – Poderia fazer um balanço sobre convênio até aqui – com o início do curso? 

Irene Guimarães Altafin – É muito gratificante observar o processo de implantação da Cooperação Técnica, mesmo que “de longe”, uma vez que deixei a sua coordenação pelo BID em outubro de 2015. A Cooperação Técnica não trata da implantação de redes de água e de coleta de esgotos, enfim de obras de engenharia, mas de mudanças de atitudes e de comportamentos. Essa construção não é rápida nem simples, mas se for realizada com cuidado e atenção se tornará um esteio para que os investimentos em saneamento sejam sustentáveis. O envolvimento dos diversos atores, a metodologia participativa utilizada na construção do diagnóstico e a criação de uma EAD fazem com que o maior mérito da CT seja a implantação de um processo de criação e de disseminação de conhecimento, que transcende a duração prevista do Convênio. Cabe agora à ABES dar continuidade por meio dos fóruns de discussão e de capacitação continuada.

ABES Notícias – Quais foram os principais desafios encontrados neste caminho e o que se espera de agora em diante?

Irene Guimarães Altafin – No meu ponto de vista, o maior desafio foi o de trazer reguladores, regulados, poder concedente e sociedade para um mesmo fórum de discussão. Fazê-los compreender que não se tratava de fortalecer “lados contra lados” e que o foco da regulação deve ser a população, que se beneficiará dos serviços com qualidade, modicidade e continuidade.  Acredito que muito se avançou neste sentido.  Outro desafio foi o de conceber uma CT que considerasse a heterogeneidade nos processos regulatórios no País. Não era interesse do BID e da ABES uma Cooperação Técnica que se voltasse apenas ao nicho dos reguladores e regulados que já estavam estruturados. Daí surgiu a ideia do EAD, modular e destinado a um público amplo em todo o País.  Outro desafio foi o de “não cair na tentação” de produzir relatórios bem elaborados, mas com utilização restrita.  Creio que esses desafios estão sendo vencidos. Esse esforço não se conclui com o término da CT. Com a CT, a ABES passa a dispor de uma ferramenta muito rica de capacitação que deverá ser utilizada em processos de capacitação continuada. Durante a execução da CT, a ABES construiu fóruns de discussão e agregou segmentos que antes atuavam de forma desarticulada e este esforço não pode ser perdido. Dar continuidade a essas discussões, sistematizar seus resultados e transformá-los em ações é algo importante que deverá ser continuado. A CT mostrou a viabilidade de se construir parcerias entre organismos financeiros e associações. Podemos considerá-la como uma semente que poderá alavancar novas parcerias da ABES com outros agentes, dando continuidade à iniciativa.

Para conhecer mais sobre o projeto, acesse http://abes-dn.org.br/regulacao/

7 Comentários em Convênio ABES e BID: leia a entrevista com Irene Guimarães Altafin, uma das idealizadoras

  1. Acredito que essa ação tenha surgido no momento certo para que a educação ambiental possa dar um salto em nosso país. Padronizar o conhecimento auxilia na troca de saberes.

  2. Parabéns pela iniciativa e a forma utilizada para disseminação do conhecimento entres associados.
    No entanto, gostaria de registrar aqui a minha surpresa relativa a minha condição de sócio e de estar em dia com a ABES, e não ter recebido com antecedência, nenhum e-mail ou informação relativa a realização do curso de EAD referente a “Regulação dos Serviços de Saneamento em parceria com o BID, e como participar do mesmo.
    Nesse sentido, gostaria de obter mais informações de como participar e me inscrever no próximo curso e/ou em cursos similares que forem utilizar a EAD.

    Carlos Alberto Leite Soares

  3. Parabenizar a ABES e o BID, pelo CT, de fundamental importância para a disseminação do conhecimento.

  4. Parabenizar pela feliz parceria ABES-BID no projeto de EAD sobre Regulação dos Serviços de Saneamento que está oportunizando dissipação de conhecimento de tema de extrema relevância com a edição da Lei n. 11.445/2007. Importante se faz destacar, o real papel da sociedade pela doutora Irene quando cita como um dos papéis da regulação a promoção do controle social com o envolvimento da sociedade não só no acompanhamento dos serviços, mas também como partícipe na proposta usar a água de maneira racional e ainda quando afirma que o foco da regulação deve ser a população que se beneficiará dos serviços com qualidade, modicidade e continuidade. E, eu acrescento, com a busca da universalização, sem medir esforços para que os usuários e localidades que não tenham capacidade de pagamento ou escala econômica suficiente para cobrir o custo integral dos serviços.

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