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Simpósio Gestão de Saneamento Ambiental em Áreas de Vulnerabilidade Socioambiental: entrevista com o palestrante Cristovão José Silva

Por Sueli Melo

No dia 19 de maio, sexta-feira, a ABES, por meio de sua Câmara Temática de Prestação de Serviços e Relacionamento com Clientes, com apoio da ABES Seção Bahia promoverá, em Salvador/BA, o Simpósio de Gestão de Saneamento Ambiental em Áreas de Vulnerabilidade Socioambiental.

A programação completa e informações para inscrições estão aqui.

O encontro reunirá representantes de empresas de saneamento, prestadoras de serviço e do Banco Mundial para discutir os desafios e casos de sucesso de operacionalização dos pilares do saneamento ambiental – água, esgoto, drenagem e resíduos sólidos –  em áreas de risco e baixa renda.

Cristovão José Silva, gerente de Departamento da Cia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP, é um dos palestrantes do evento. Ele vai abordar o tema “Regularização dos serviços de água e esgoto em núcleos de baixa renda pela modalidade de contratos de performance”?

Na entrevista a seguir, o especialista expõe sua visão sobre o assunto.

ABES Notícias – Qual a importância do evento e da discussão acerca do tema de sua apresentação: Regularização dos serviços de água e esgoto em núcleos de baixa renda pela modalidade de contratos de “performance”?

Cristovão José Silva –  As perdas de água constituem hoje num dos maiores problemas enfrentados pelas empresas de saneamento. Os maiores vilões são as ligações clandestinas que se encontram na sua maioria em áreas com habitações subnormais e grande desordem urbanística, imperando um alto índice de vulnerabilidade social, pois nelas há uma concentração grande de famílias com baixa renda econômica, além de possuir uma densidade demográfica muito além do normal. Diante deste cenário a regularização de serviços de água e esgoto requer obras de alta complexidade, exigindo assim altos investimentos para o saneamento, de maneira que há um grande desafio por parte destas empresas. Para que estas obras sejam implementadas, as formas mais utilizadas atualmente nas empresas de saneamento são contratos com empresas prestadoras deste tipo de serviços. Porém, estes não garantem o sucesso desta ação, uma vez que são limitados quanto ao seu resultado. É aí que entra a nova modalidade contratual chamada de “contratos de performance”, nos quais a garantia de retorno é superior aos contatos tradicionais, tendo como principal premissa o fato do contratado não ser remunerado apenas pela entrega do serviço, mas principalmente pelas metas estabelecidas em contrato.

ABES Notícias  – Poderia comentar brevemente sobre o tema?

Cristovão José Silva – Nas áreas carentes onde prevalece a clandestinidade do fornecimento de água, o índice de perdas é muito elevado, logo, bem preocupante por parte das autoridades. Portanto, na tentativa de reverter este cenário, surge no meio do saneamento uma nova modalidade de contrato de perdas, denominado “contrato de performance”, uma vez que contribui de forma quantitativa e qualitativa para a redução dessas perdas. Um dos entraves para o trabalho de regularização por parte das empresas de saneamento é a busca de recursos e ou financiamentos para a execução da ação, contudo na nova modelagem contratual, o investimento inicial fica totalmente a cargo da empresa contratada. Estas áreas são desprovidas de vários aspectos sociais e ambientais, daí a sua classificação de alta vulnerabilidade social, de modo que a execução de obras de regularização de ligações clandestinas não pode ser feita da forma tradicional, pois o resultado será apenas na questão física das perdas, ao passo que a questão social é deixada de lado. Nos contratos tradicionais não existe clausula na questão socioambiental, monitoramento, sendo esta uma das premissas dos contratos de performance de regularização de ligações em áreas de baixa renda.

ABES Notícias – Considerando as condições do saneamento no Brasil – principalmente nas áreas carentes -, quais são os principais desafios e entraves desta regularização nestes termos (contratos de performance)?

Cristóvão José Silva – Os principais desafios do contrato de performance nestas áreas são:

  • Alta complexidade de obra, devido a topografia do local, onde impera a desordenação urbana dos imóveis que lá se encontram. Em muitos casos trata-se de um aglomerado de casas, dificultando os trabalhos, que muitas vezes tem que ser feito completamente manualmente, pois o acesso com os maquinários não é possível devido a inexistência de arruamento e as passagens serem, muitas vezes, extremamente estreitas, dificultando até mesmo os trabalhos manuais;
  • Em algumas áreas há um alto índice de violência, predominando roubos e furtos de equipamentos e funcionários das concessionárias atuantes nestes locais, obrigando assim um trabalho complexo de desenvolvimento social para o acesso normal a estes locais;
  • Ações isoladas em relação às regularizações de água e esgoto executadas, visto que estas deveriam ser precedidas de obras estruturantes de urbanização.

ABES Notícias – E quais são os benefícios? Poderia citar exemplos bem-sucedidos?

Cristovão José Silva – Benefícios:

  • Inclusão social dos moradores destes locais, uma vez que em muitos casos após a regularização das ligações clandestinas, os moradores recebem uma conta de água com o seu nome cadastrado. Isso possibilita o acesso aos serviços oferecidos tanto públicos quanto privados, como por exemplo creches, financiamento em lojas, entre outros;
  • Garantia de 100% de potabilidade da água fornecida;
  • Agilidade na execução dos serviços;
  • População sensibilizada quanto à importância das regularizações de água efetuadas;
  • Maior conscientização em relação ao uso consciente da água;
  • Conhecimento em educação ambiental adquirido pela comunidade por meio de palestras e reuniões efetuadas com esta finalidade, atingindo assim tanto adultos, quanto crianças;
  • Melhor relacionamento com os clientes, uma vez que existe a obrigatoriedade de acompanhamento do consumo após a finalização das obras, estreitando o contato com os moradores;
  • Boa aceitabilidade dos serviços prestados, assim como o zelo pelos materiais aplicados no local;
  • Contribuição com a redução do índice de reincidências de ligações clandestinas;
  • Melhora da imagem do poder público, percebida pelos moradores;
  • Redução da taxa de mortalidade infantil e doenças de veiculação hídrica.

Exemplos bem-sucedidos: 66 áreas regularizadas no âmbito da nossa UGR, como a localizada no extremo da cidade de Embu das Artes, a regularização do núcleo denominado Pegaso;

ABES Notícias – Na sua visão, de maneira geral, qual é a situação da gestão dos serviços de água e esgoto no Brasil? Quais seriam as possíveis soluções para os diversos problemas que a população sócio e ambientalmente vulnerável enfrenta?

Cristovão José Silva –  Os índices de atendimento dos serviços de abastecimento de água e saneamento no Brasil ainda estão distantes da universalização pretendida e necessária, especialmente nas regiões Norte e Nordeste do país. Há, assim, uma grande disparidade entre as demais regiões. O maior déficit se concentra em áreas de baixa renda, bem como nas periferias das grandes cidades. Com a ausência e/ou insuficiência de saneamento nessas áreas, a incidência de doenças de veiculação hídrica, bem como a mortalidade infantil alcança altos níveis, afetando diretamente a qualidade de vida nestes locais. Há também a questão do alto índice de perdas de água, o que reduz o faturamento das empresas operadoras de saneamento e, consequentemente, a sua capacidade de investimento e obtenção de financiamentos externos e internos. Isso torna a gestão desses serviços nas empresas localizadas nas regiões de maior precariedade sanitária, um grande desafio devido às questões já apresentadas. Já nas regiões de melhor capacidade de saneamento, a gestão é mais favorável a resultados mais positivos, pois os recursos são mais acessíveis.

Possíveis soluções para as questões socioambientais:

  • Empresas de saneamento públicas ou privadas eficazes na prestação de serviços com preço e qualidade compatíveis com a realidade local;
  • Desoneração fiscal do setor de saneamento;
  • Linha de crédito subsidiada pelo governo Federal para atuação em áreas de baixa renda;
  • Política efetiva de saneamento para regularização dessas áreas
  • Planejamento ordenado/integrado para manutenção de áreas verdes urbanas;
  • Criação de áreas verdes quando não houver cobertura vegetal, em virtude de desmatamento decorrente da ocupação desordenada, inclusive com a implantação de parques lineares;
  • Implantação de sistema de drenagem de águas pluviais;
  • Disposição correta e reciclagem de resíduos sólido;
  • Sensibilização dos moradores dessas áreas carentes quanto à importância da manutenção das regularizações feitas;
  • Educação ambiental para toda população;
  • Delimitação das áreas ocupadas de forma irregular e desordenada, detendo assim o crescimento desenfreado;
  • Acompanhamento e monitoramento das ações socioambientais realizadas nestas áreas, por parte dos órgãos públicos, privados, ONGs, associações comunitárias, religiosas, entre outras, garantindo o engajamento de todas estas organizações e a perenidade do fruto desses trabalhos.

ABES Notícias – Considerações finais

Cristovão José Silva – De maneira geral entendemos que para que o trabalho de regularização de ligações de água e esgoto em áreas de alta vulnerabilidade social tenha resultados eficientes e eficazes, é preciso implementar algumas políticas que respondam principalmente a estas classes menos favoráveis: Empresas de saneamento públicas ou privadas atuando dentro do setor de forma eficaz e eficiente com foco em boa prestação de serviços com qualidade e preço acessível; Políticas públicas com recursos de financiamento e subsídios pelo Governo Federal; Linhas de créditos permanentes subsidiadas para os programas de redução de perdas; Gestão de saneamento  com foco nas áreas de vulnerabilidade social.

 

Cristóvão José da Silva

Graduado em Administração de Empresas pela Faculdade Campos Salles; com pós graduação em Gestão Pública pela Universidade de Mogi das Cruzes e especialista em Gestão Ambiental pela USP.

Mais de 35 anos de atuação no setor de saneamento ambiental, exercendo a função de Gerente de Departamento da Cia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – SABESP em projetos técnicos e comerciais. A vasta visão de operação lhe rendeu diversos reconhecimentos comerciais em casos em que a experiência nas áreas de manutenção e expansão das redes de água e esgotos, medição e faturamento, representação institucional e relações com o poder concedente, os clientes e a sociedade foi diferencial no atingimento de metas desafiadoras, especialmente em áreas de baixa renda.

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